quarta-feira, 1 de julho de 2009

No alto

No alto de um morro, no final de uma trilha, um homem observa o crepúsculo de mais um dia infeliz. Ao seu redor, árvores com galhos finos e secos rangem e derrubam suas últimas folhas. O céu exibe um azul esverdeado e algumas nuvens formam belos cachecóis que se estendem até onde consegue enxergar. Com as mãos nos bolsos do jeans e com o capuz da blusa sobre a cabeça, o homem vê a noite sobrevir sobre a cidade.

Durante esse tempo, passam por sua cabeça dez assuntos diferentes. Desde a proposta de emprego que recusara até a comida que se esquecera de colocar na tigela do cachorro. Andava completamente distraído ultimamente... Desde que a Senhora o abandonara, sua vida perdera o foco, a graça, o sentido...

“Oh, Senhora, por que me abandonaste? Seria porque às vezes ficava nervoso demais? Mas quem consegue permanecer contente sempre? Bem sabes que não sou esse tipo. Ah, se eu soubesse como ser eternamente feliz! Para poder beijar eternamente seus pequenos e delicados lábios... És tão maravilhosa, tão imponente, que o que eu queria, realmente, era atirar-me aos seus pés e implorar que jamais me abandonasse. Mas sou bruto e orgulhoso demais para coisa tão sentimental e preferi conter meu amor por medo de perder o seu. E, ainda assim, o perdi.

Um som de gravetos quebrando ao longe tirou o homem de suas dores. Será que havia mais alguém além dele e da sua Senhora que conheciam aquele lugar? O som estava cada vez mais próximo. “Será que devo me esconder?”, pensou o homem, mas estava com o coração tão machucado que não conseguia se mover. Ora, nem queria.

Nada mais lhe importava. Poderia acontecer o que fosse. Então, ele vê um vulto aparecer no começo da curva da trilha, uns dez metros abaixo. Sobe convicto, certamente já estivera ali antes. Como vem subindo de cabeça baixa, não vê o homem nas sombras e apenas passa ao seu lado. É uma mulher. Um segundo depois que ela passa, sente o seu perfume. É a sua Senhora. E ele nunca a percebera tão bela. Banhada pela cálida luz da lua cheia, ela olha para as luzes cintilantes da pequena cidade. Naquele rosto magro, de nariz levemente arrebitado e de bochechas rosadas, ele nota uma expressão de cansaço e tristeza... Estaria vendo sua senhora ou um anjo?

Vagarosamente, o homem mexe a perna, mas um galho imediatamente estrala e faz a Senhora olhar para trás. Ambos se encaram por um breve instante e ela suspira o nome dele; este, por sua vez, não consegue acreditar no que está vendo. “Perdi a razão”, conclui. Uma brisa sopra e os longos e encaracolados cabelos dela esvoaçam. As folhas levantam do chão e rodopiam ao redor do lindo vestido branco que ela usa, levantando-o um pouco graciosamente e revelando seus tornozelos. Oh, que imagem que contempla o apaixonado homem! Seguramente enlouquecera. Apreensivo, aproxima-se até ficar frente a frente com ela. Estende lentamente a mão e, tremendo, toca-lhe o rosto. Espantado vê sua mão atravessar-lhe a pele e sente seu braço congelar.

Nesse instante, que parece durar uma eternidade, o homem e a Senhora olham na mesma direção. Estariam se olhando? No entanto, apenas um contém vida em seu corpo.

Autor: Alexandre Kuciak - Estudante de Letras

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